sábado, 10 de janeiro de 2015

Por cá e por além-mar em Africa

                                                                                                             Maria Cacilda Marado

Já não é muito nova, quarenta e um anos ninguém lhos tira, mas mantém-se de pé e com firmeza sempre que a requisitam para cumprir a sua missão. Tenho visto companheiras suas mais jovens desengonçarem-se todas ao mais pequeno desajeitar das mãos de quem as usa. Realmente, o utensílio de que vos estou a falar tem uma história notável. Com apenas seis anos de idade, transpôs o oceano Atlântico com garbo e valentia.
Uma vez deu-me cabo de um pé...
Arrumadinha num contentor, nunca deu sinal de si até que, quase um mês depois, a pus novamente ao serviço da família. Sim, ela esteve em terras de África, onde, durante dois anos e meio, desempenhou bem a missão para que foi criada. E permitiu muitas descargas de adrenalina enquanto se deixava usar para o fim a que se destina. Foi utilizada por mim e por outros sempre que era necessário mimar quem se queria alindar. Uma vez, deu-me cabo de um pé quando fui desajeitada ao pô-la sobre as suas duas firmes sustentações. No entanto, eu tenho por ela uma estima tão grande que, dois anos e meio depois de ela ter ido para Angola comigo, quando regressei, não quis deixá-la numa terra de desassossego, no pós-25 de Abril, época bem conturbada pelos movimentos de independência.

E lá a trouxe de novo, no fundo de um outro contentor que mais tarde se transformou numa bela estante. Mas, voltando ao meu utensílio de estimação, hoje, tanto tempo já passado, ainda me alivia as tensões quando corro em cima dela com o meu bólide de corridas, quando aprimoro os tecidos, quando liberto as tensões, quando faço conjecturas e elaboro projectos. Para a guardar, escolho sempre um cantinho para não me perturbar as correrias de última hora. Mas não sou só eu que lhe quero bem; a minha filha tem por ela uma estima especial, pois liberta-a de algumas tarefas que teria de fazer na casa dela.

Maria Cacilda Marado ©2015,Aveiro,Portugal

1 comentário:

  1. Fazer de um utensílio de aprimorar tecidos uma personagem tão misteriosa e viajada é cativante.

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